Com a crise, o design português irá sofrer na sua reputação colectiva. Internacionalmente, onde Portugal aparece sobretudo como uma das mascotes atarantadas da crise, qualquer iniciativa que sugira a hipótese de andar a gastar dinheiro em design será interpretada, de acordo com a benevolência ou não do comentador, como a) um milagre: apesar da crise, eles ainda têm design b) um desperdício: apesar da crise, eles ainda têm design. Ou seja, os mesmos eventos, iniciativas ou objectos serão interpretados com condescendência ou com escândalo, usando exactamente os mesmos argumentos, e nenhuma das opções tornará a vida dos designers portugueses mais fácil.
Formalmente, o estereótipo do país à beira da catástrofe poderia atenuar-se com o o uso de um design mais espartano, se não mesmo puritano, mas o design português sempre foi melhor no excesso do que no minimalismo. Tirando o ornamento, ficaria à vista a pobreza recorrente (e por vezes mesmo orgulhosa) do detalhe. Ignorar o pormenor ou o bom acabamento, sobretudo no que toca ao design, é visto aqui como sinal de que se está a pensar em coisas mais elevadas. Não seriamos bons Shakers ou Suíços.
Institucionalmente, cultivamos o hábito de juntar o pouco dinheiro que temos gastando-o em coisas grandes, sejam elas cidades, museus, bienais, expos ou estádios, principalmente como factor de orgulho pátrio, deixando as coisas pequenas à sua sorte. Com a crise, a estratégia parecerá ainda mais megalómana e escandalosa. Se houvesse juízo, promover-se-iam antes as iniciativas de pequena escala com um alcance local, mais social ou político.
Mas os maus hábitos levam tempo a morrer e, muito provavelmente, continuar-se-á a dar o grosso do dinheiro a grandes instituições que, se forem espertas, começarão a apoiar a sua imagem não em grandes gestos mas em emprestar visibilidade a pequenas iniciativas, alternativas, locais, de jovens, que não ganharão mais com isso do que o nome da grande instituição – que é o mesmo que dizer que vão ser pagos em visibilidade, quando o que estão a fazer é precisamente ajudar a disfarçar a visibilidade e a escala de quem os convida.
De acordo, Mário. Mas para isso seria preciso que alguém, num sítio qualquer perto do poder, pensasse nessas coisas, certo? Seria preciso que houvesse uma vaga ideia (política) do que fazer com o Design.
Nos últimos anos, houve uma proximidade evidente entre o CPD e o governo, na pessoa do seu presidente (Não que isso tenha dado muito resultado).
Parece-me que o problema de base é que os designers têm sido preparados para exercerem um serviço empresarial e não para intervirem ou participarem na discussão pública. A política é apenas um nicho, um tema ou um passatempo e não uma formação cívica de base.
Sem essa redefinição de competências será difícil haver uma representação eficaz.
Sim, Mário. Reconheço esse esforço e a sua importância. O problema continua a estar na falta de percepção da parte dos poderes políticos para reconhecer a importância do design. Tenho andado à cata disso em programas políticos, manifestos eleitorais, intervenções parlamentares, etc. Sem grande surpresa, o cenário é desolador.
Quanto às culpas dos designers, e de quem os forma, são obviamente também muitas. Fica a sensação que há por começar por aí: explicando aos designers as funções do design. E esta constatação é ainda mais trágica…