Quando se mostra os trabalhos de um designer há a tendência para se valorizar os que fazem um bom “quadro”, aqueles que funcionam bem isoladamente, a capa de um livro, de um disco, um poster, porque é mais difícil reproduzir objectos complexos como um livro, que ficam a perder quase tudo quando reduzidos a uma imagem. Quando muito, pode-se mostrar meia dúzia de páginas mais interessantes, mas expor um livro – seja numa galeria, seja em outro livro – é uma tarefa ingrata.
Há assim designers, mais especializados no ritmo de uma publicação, em contar histórias usando a relação das imagens com os textos, fazendo livros que se lêem e se folheiam sem que nenhum desses actos seja menosprezado, que ficam a perder quando aparecem nos livros de história ou nas revistas de design. Fernando Azevedo, autor de belíssimos catálogos da cinemateca é um deles, mas Sebastião Rodrigues, conhecido sobretudo pelas suas capas e cartazes foi também um designer ainda mais apurado de livros.
Durante o governo de Marcello Caetano produziu um conjunto de publicações para o S.E.I.T. que são do melhor que tenho visto. Fizeram sem dúvida parte de uma tentativa de sublinhar graficamente a abertura do regime, usando para isso um estilo quase suíço. Poderíamos especular que os primeiros anos do regime de Salazar correspondem à institucionalização das vanguardas num primeiro modernismo através do trabalho de António Ferro no S.P.N. e S.N.I. que acabaria por perder o seu folêgo nas décadas de 50 e 60. O trabalho de Rodrigues no S.E.I.T. seria uma aplicação das tendências do modernismo tardio ao contexto português.
A melhor das suas publicações foi sem dúvida “Portugal – Um País que Importa Conhecer”, editada em 1972, um grande ensaio visual sobre Portugal e as suas colónias, dando um retrato idílico, progressista e optimista das indústrias, serviços, ensino e sobretudo turismo. Nunca será tão considerado como Lisboa, Cidade Triste Alegre, menos por causa do seu estatuto de propaganda de regime do que por ser uma fotomontagem construída através do recurso a um extenso material de arquivo e da produção de um batalhão de fotógrafos sob a direcção de Augusto Cabrita.
Contudo, esta construção de um livro a partir do reenquadramento e remontagem dramáticos de material original, de arquivo, da televisão, do cinema, tendo apenas como critério a produção de um objecto arrebatador, foi uma tendência da época, bem visível nos guias de Chris Marker, nos livros de Quentin Fiore para os textos de Mcluhan ou nos catálogos da Cinemateca de Azevedo, e que se perdeu devido talvez à ética actual de não cortar e reenquadrar imagens, usando-as do modo mais autêntico possível, sacrificando assim a lógica própria da paginação à apresentação de objectos puros sobre margens brancas.
De “Portugal”, um destes foto-livros que já não se fazem, a imagem que fica é a de um país como um sistema complexo de metrópole e colónias, turismo e pesca, ensino e investigação, oscilando vertiginosamente entre os grandes planos granulosos, rápidas sensações urbanas, grandes panorâmicas, movimentos de multidões e de maquinaria, vistas aéreas que reduzem a paisagem a uma textura abstracta.
(E assim comemoro o post 400 com o Sebastião Rodrigues)
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as fotos são também do Sebastião Rodrigues?
Não, são de Augusto Cabrita, Alfredo Tropa e mais uns tantos.
Folheei este livro na Feira do Livro de Lisboa. Coisa sólida, e há algo na cor destas fotos de inícios dos anos 70 que é muito atraente.
[…] 2009 (cerca de ano e meio depois); a terceira, pouco mais de um ano depois, em Setembro de 2010; a quarta, em Julho deste ano (há três meses). Nos primeiros anos escrevia um post por semana, em geral […]
[…] de mercado. Curiosamente, isso é perfeitamente visível no design gráfico. Quando se convoca Sebastião Rodrigues para produzir o material gráfico do regime, já não é com as mesmas intenções e métodos do […]
[…] da sua obra que não costuma ser referida. Em trabalhos como 1968-1975 Cinco Anos de Governo ou Portugal Um País que Importa Conhecer ilustra graficamente discursos do ditador. Estas obras estão significativamente ausentes tanto do […]