Há sempre quem defenda que as artes devem ser marginais. Pessoalmente discordo. Acredito que, nos tempos que correm, devem ser transgressivas mas o menos marginais possível. O que quero dizer com isto? É simples: enquanto marginal significa exclusão voluntária ou involuntária, transgressão significa recusar ou ignorar barreiras, ser o mais móvel possível, recusar essa exclusão.
Dizer que a marginalidade garante liberdade e autonomia à cultura é um argumento confortável. Garante por um lado ao poder político que abandonar as artes à sua sorte, cortando-lhes o financiamento e o acesso a recursos públicos até é um favor. Pelo lado dos artistas, dá-lhes uma ilusão romântica de autonomia, de agência, que na prática significa uma identidade que se auto-exclui da discussão pública. É uma marginalidade que não chateia ninguém, antes pelo contrário.
A transgressividade, pelo contrário, não se esconde nem se arruma. Recusa o lugar que lhe é destinado. Se está fora da discussão pública, reclama-a para si e para outros. Numa sociedade cada vez mais desigual, reclama a igualdade e a mobilidade.
É claro que isto não se aplica apenas às artes mas à própria identidade pública. A marginalização significa sobretudo não ter acesso fácil a essa identidade. A luta pelos direitos das mulheres, pelo casamento entre pessoas do mesmo sexo, pela integração de minorias é sempre transgressiva – o termo mais comum é “fracturante”. No fundo, trata-se de recusar a marginalidade imposta ou conformada.
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por acaso ensinaram-me na faculdade que a marginalidade (no seu sentido literal – estar na margem) era uma característica do artista. foi argumentado na altura a observação de um ponto (quase) externo e eu proprio tenho uma citação ranheira do livro do desassossego que diz algo como “quem dança no canto do salao não dança sozinho. dança com toda a gente.”
por outro lado sempre achei que a transgressão e afins eram demasiado juvenis e a recusa do lugar que nos destinaram entra um pouco nessa categoria mas cada vez mais acho que a autonomia não pode ter receio nem da marginalidade nem da transgressão, muitas vezes consequência uma da outra e sem ordem de aparição implícita.
opções éticas à parte, o que me chateia é que nos dias que correm parece nao haver meio termo nem grandes hipóteses de o alcançar.