Quando era novito e as coisas – livros, bds, filmes –, demoravam mais a chegar, costumava inventar as minhas próprias versões enquanto esperava. Fazia bandas desenhadas toscas a partir de um só quadradinho ou de uma capa reproduzidos em ponto pequeno na revista Tintin ou Selecções BD. Fazia um filme inteiro a partir de um still. A criatividade era uma maneira de preencher o tempo, porque o tempo era de escassez, e o sítio era periférico.
Sei que esse hábito infantil me marcou. Continuo a construir versões a partir de fragmentos de experiências vividas indirectamente. A crítica é, por vezes, uma maneira de o fazer. Não se trata de receber passivamente o que vem de cima ou de fora mas de o reconstruir nos nossos próprios termos. Não me importa tanto perceber a obra, as suas origens ou a sua originalidade, mas perguntar se me é útil, se é possível existir aqui, e porquê. Não me interessa a tradução ou a divulgação, interessa-me a apropriação.
Enfim, tudo isto para dizer que colecciono desde há muito revistas de design, mas a maior influência da monumentânea é uma revista que nunca vi ao vivo – a TM ou Typografische Monatsblatter. O modo como quebravam palavras, distribuindo-as por uma grelha, sempre me pasmou.
Nunca a comprei, porque é cara.
Já com a primeira revista, que mais tarde se transformou neste blog sem chegar a ser impressa, tinha sucedido o mesmo: era uma versão do que eu pensava ser a McSweeney’s. Estava enganado, como verifiquei ao folhear a revista, anos mais tarde, mas ainda bem.
Quando se importa qualquer coisa mal, importa perceber que a distorção somos nós mesmos.
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