É só em Setembro mas The Invisibles fazem vinte anos. Parece impossível. Para mim, é (juntamente com Love & Rockets ou Carl Barks) daquelas bandas desenhadas às quais volto sempre que posso, porque cada leitura revela pormenores, quanto mais não seja em mim mesmo, que vou mudando.
Quando ouvi falar dela primeira vez, ainda como uma história que estava para sair, pareceu-me pretensiosa e provavelmente falhada. A carreira de Grant Morrison, o argumentista, tinha começado bem, com Zenith, Doom Patrol e Animal Man, mas tinha-se enchido de referências místicas e provocação forçada. Os protagonistas de Invisibles não auguravam nada de bom: um assassino careca com a cara coberta de piercings, um travesti brasileiro, um jovem rúfia de Liverpool, etc. Resisti por dezoito números, depois esta capa convenceu-me.
(mais tarde, num Carnaval fui vestido de Gideon Stargrave, a homenagem de Morrison ao Jerry Cornelius de Moorcock
)
A história era ainda mais estranha do que parecia: um grupo anarquista combatia uma conspiração extra-dimensional. Havia viagens no tempo à Revolução Francesa, aos anarquistas do começo do século XX, ao então futuro de 2008 e 2012 – entretanto tornou-se numa daquelas histórias de ficção científica que passou de prazo. Havia um vírus lettriste que fazia detournment aos balões de fala dos personagens, impedindo-os de comunicar entre si. Byron. Sade, e muito mais. Na altura, não percebia metade das referências, coisas que apareciam na televisão inglesa mas não passavam por cá. Foi a primeira vez que li o nome King Mob, o pseudónimo do protagonista mas também o nome de um grupo dissidente do situacionismo que fez uma acção num grande armazém de Londres onde um deles, vestido de Pai Natal, deu brinquedos das prateleiras às criancinhas, que depois tiveram de ser confiscados pela polícia no meio do berreiro geral. Era uma versão de outra acção, o famoso Mill-In at Macy’s dos Black Mask. Calculo que venha daí o meu gosto pela periferia (nem tanto pela coisa em si) do situacionismo. Ler The Invisibles era uma aventura, com Morrison quase a morrer de uma infecção pulmonar nos primeiros números e a vir convalescer a Portugal, a pedir na secção de cartas para os leitores salvarem a revista com um feitiço que envolvia masturbação colectiva, etc.
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Comecei o mês passado está empreitada, estou colada!