Não fui à exposição sobre o SAAL em Serralves. É provável que não vá. Ando desde há muito tempo num boicote suave ao museu. Vou quando é trabalho ou me interessa muito. A mera curiosidade ou o “tens que ir ver” não me comovem. Pelo contrário fui ver a exposição sobre “O Lado B da Escola do Porto” que me pôs a pensar e a discutir e sobre a qual não consigo deixar de pensar. É comum nas discussões que tive o SAAL e o tal lado B serem postos em contraponto. Não sei se é apenas a necessidade de haver sempre uma simetria ou uma dialética onde na realidade há apenas uma sopa.
Em todo o caso, numa dessas conversas falou-se de um conjunto de arquitectos que nos anos 70 não se alinhavam com o discurso dominante das escolas que era maoísta. Essas pessoas eram conservadoras, monárquicas ou até e simplesmente apolíticas e apropriavam-se do discurso politizado, utópico, da época de um modo delirante e subversivo,usando para isso estratégias desenvolvidas pelos situacionistas, alguns dos quais chegaram mesmo a conhecer, tendo vindo ao Porto, etc. É mais um exemplo de como as ideias mudam subtilmente como viajam e acabam por não ter dono nem origem: as mesmas estratégias que servem de rastilho ao Maio de 68 são usadas como uma espécie de contra-revolução em Portugal.
E não surpreende. Desse situacionismo monárquico e conservador pode ver-se como descendente muito directo Miguel Esteves Cardoso. É desta zona que nos chega Portas e parte do poder que nos governa.
Outra parte chega-nos curiosamente do lado do maoísmo que (para mim que não sei muito sobre essas coisas) acaba por ser a gosma primordial de onde rastejaram o Durão Barroso, o José Manuel Fernandes e a China actual, que nada ironicamente é vista como um modelo de competitividade-barra-capitalismo-orgulhosamente-totalitário por quem nos governa.
Assim, estas exposições acabam por nos trazer ao território onde começaram as nossas aflições actuais e é interessante.
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olá mário, a tua reflexão é bastante interessante. parece-me, no entanto, muito injusta. numa breve leitura presumo que o teu amigo te terá falado de alguém que eventualmente terá estado associado ao lado b e que é conservador e monárquico. julgar o todo por uma pequena parte é limitado. posso afirmar que conheço relativamente bem o lado b. não o vivi mas há anos que ouço as histórias. foi a primeira vez que ouvi associado a este “grupo” as palavras monarquia e conservadorismo.
se deres uma breve leitura ao catálogo da exposição apercebes-te de várias posições que, por muito que tente, não consigo encontrar equivalência nos conceitos (por mais abrangentes que sejam) de monarquia ou conservadorismo:
1. encaram a Escola como um espaço onde a experimentação tem que existir;
2. a escola é totalmente livre de condicionamentos estilísticos ou estéticos;
3. o pensamento único condiciona a liberdade (a oposição ao sal);
4. proto-“hortas-urbanas” da ESBAP até à ribeira;
acredito que se possam encontrar atitudes próximas do niilismo. acredito que haja gente com tendências monárquicas ou conservadoras, ali pelo meio. o que não é sério é meter paulos portas no mesmo saco. talvez estivessem “noutra”, com vontade de olhar para superstudios e por aí fora.
voltando ao início, a reflexão tem muito interesse e merecia um estudo mais aprofundado. nessa lógica, parabéns pelo título.
Tens toda a razão e de facto peguei num pormenor muito reduzido que nem sequer veio da exposição mas de discussões à volta dela.
Por curiosidade, conheci um dos membros que tinha ligações aos situacionistas e tinha simpatias monárquicas (embora duvide que ele se definisse a si próprio desse modo).
(E de facto ninguém merece o Paulo Portas)