Não é muito difícil encontrar casos de discriminação dentro do design. Basta pensar um bocadinho. Por exemplo, dou aulas de design vai fazer dezanove anos e acho que ainda não apanhei dez alunos africanos ou afro-descendentes ao todo. Nos Estados Unidos, acontece o mesmo, e já se reflectiu sobre as razões. É muito difícil à maioria dos afrodescendentes investir um monte de dinheiro numa profissão que se sabe precária. Daí que se defendam iniciativas de acção afirmativa.
Também se pode ir um bocadinho mais fundo na história do design e encontrar-lhe as raízes disciplinares no comércio imperialista da Inglaterra do século XIX. Muita da teoria do design da época funcionava como um modo de apropriar linguagens decorativas vindas de todo o mundo para as abstrair num sistema que permitia reproduzi-las comercialmente exportando-as de novo para todo o mundo (trato disso no ensaio que dá o título ao meu livro).
Quase desde o começo, a presença de mulheres nas turmas cresceu ao ponto de se tornar maioritária. Mas ainda se apanha gente, professores até, a dizer que o design não é uma coisa de mulheres. Os argumentos são os do costume – os filhos, a casa, etc. Algumas mulheres já vão tendo alguma visibilidade, mas olhando além da superfície, percebe-se que em muitos casos o trabalho é feito e pago de modo muito distinto. Cá no Porto, a maioria das mulheres com visibilidade internacional tende a trabalhar como funcionário. A maioria dos homens tende a ser patrão do seu próprio estúdio.
Talvez o caso mais óbvio e menos óbvio de segregação dentro do design seja o da homossexualidade. Ainda outro dia, uma mulher (não designer) que me descrevia um caso terrível de discriminação da qual tinha sido alvo, acrescentava que no design haveria o problema de estar dominado pelo «lobby gay». Para ela, como para muita gente, o design seria uma área tão dominada pela homossexualidade que até se poderia falar de uma conspiração para manter os heterossexuais de fora. Para quem trabalhe em design gráfico, a ideia é ridícula. São raríssimos os designers que assumem um identidade pública LGBT. E mais raros ainda os que são bem sucedidos.
Há uns anos, alguém me dizia em voz baixa de uma figura cimeira e falecida do design português que, apesar de casado, «tinha de vez em quando casos com homens» – acho que foi a coisa mais próxima de uma reflexão histórica sobre o assunto aqui em Portugal. De resto, nunca apanhei nada escrito, nunca apanhei nada conferenciado. Aliás, o mais comum é ouvir-se gente a reforçar a ideia: lembro-me de o Peter Saville ter brincado numa conferência que, quando trabalhava no mundo da moda, assumia maneirismos gay. Ou seja, é uma ideia que se tem sobre o design mas que os designers fazem tudo por tudo por contrariar. No caso do design gráfico, há aliás textos clássicos, ainda ensinados nas escolas, onde se dá a entender que o design só será respeitado quando for menos efeminado. Muito do ethos do designer modernista é construído contra essa identidade.
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