The Ressabiator

Ícone

Se não podes pô-los a pensar uma vez, podes pô-los a pensar duas vezes

Um balanço de 2023

Tinha pensado dedicar 2023 à imagem no design. Pouco fiz. Só na segunda metade do ano retomei as leituras nessa área.

Acabei a investigar o caso da História do Design Gráfico em Portugal, do qual saíram muitíssimo mal os parceiros que lançaram cá para fora uma obra com um ror de problemas. Para os resolver, reeditaram-na ainda com um ror de problemas. Acompanharam-na com uma sucessão de desculpas indignas. Ficou mal o jornalismo (o jornal que lançou a coisa), a edição (a editora que, face à “escassez de papel”, conseguiu ainda assim soltar a coisa no mundo), a academia (a instituição académica que também editou a coisa), e, abaixo destes todos, o design como disciplina. Décadas de suposto rigor científico, de discussões sobre ética e crítica, redundaram em silêncio, se não cumplicidade.

(Confesso que me parece pueril todo o rasgar de vestes em torno da vinda da inteligência artificial, quando pouco se está disposto a fazer em relação a problemas perfeitamente artesanais como os da HDGP.)

Aos que meteram a cabeça fora do buraco neste caso, aos que falaram, aos que se indignaram em público, aos que ajudaram, à equipa, a todos, enfim, que, na Hora H, estiveram lá: “We few, we happy few, we band of brothers.”

Filed under: Crítica

No more ‘I love You’s’

Não tenho listas de fim de ano. Fugi das séries e filmes mais falados. Não para descobrir pérolas escondidas. Ou para manter a independência. Fi-lo para escapar à obrigação de ter sobre elas uma opinião. Não sou crítico de televisão ou de cinema.

Este ano, canalizei a minha opinião e atenção para outros fins: o caso da História do Design Gráfico em Portugal e as implicações na minha família do 7 de outubro e da guerra em Gaza. É-me muito difícil ver filmes ficcionais de guerra desde a invasão em grande escala da Ucrânia.

Dou-me bem com entretenimento de pequena escala sobre o qual quase ninguém fala. Gostei de Drops of God, um thriller familiar sobre vinhos, adaptado de uma BD japonesa. Aprendi a apreciar momentos isolados em séries que, provavelmente, não terminarei.

Há um desses momentos no começo de Murder at the End of the World. É uma cena onde são transparentes os processos dos argumentistas e dos actores. Temos conhecimento do truque, mas ele não fica menos forte por isso. O casal representado por Emma Corrin e Harris Dickinson ouvem “No more ‘I love You’s’”, de Annie Lennox, na aparelhagem do carro enquanto vão investigar a última pista de um caso envolvendo um serial killer. Cantam em conjunto, estabelecendo a sua cumplicidade frágil e tensa. A música é um augúrio. A série não voltou a “apanhar-me” deste modo.

Investiguei “No more ‘I love You’s’”. Não sabia ser uma cover da banda The Lover Speaks. A versão original lembra-me a tendência de que faziam parte os Sétima Legião. É mais rápida e apoiada em sintetizadores que a versão de Lennox. Mal se ouve o dubidubidu. O teledisco é tão típico dos anos 1980: uma tentativa de fazer um filme mudo expressionista com o pixel esmagado do vídeo da altura.

Logo que vi o nome da banda, The Lover Speaks, tive de ir ver se “No more ‘I love You’s’” era inspirado em Barthes. De facto é um disco inteiro inspirado em Fragmentos de um Discurso Amoroso. A banda cruzou Barthes com o gótico dos New Romantics. Os anos 1980 foram realmente uma década de portentos.

Filed under: Crítica

Mário Moura

Mário Moura, blogger, conferencista, crítico.

Autor do livro O Design que o Design Não Vê (Orfeu Negro, 2018). Parte dos seus textos foram recolhidos no livro Design em Tempos de Crise (Braço de Ferro, 2009). A sua tese de doutoramento trata da autoria no design.

Dá aulas na FBAUP (História e Crítica do Design Tipografia, Edição) e pertence ao Centro de Investigação i2ads.

História Universal do: Estágio

O "Estágio"
O Negócio Perfeito
Maus Empregos
Trabalho a Sério
Design & Desilusão
"Fatalismo ou quê?"
Liberal, irreal, social
Conformismo
Juventude em Marcha
A Eterna Juventude
Indústrias Familiares
Papá, De Onde Vêm os Designers?
Geração Espontânea
O Parlamento das Cantigas
Soluções...

História Universal dos: Zombies

Zombies Capitalistas do Espaço Sideral
Vampiros, Zombies, Classe Média

Comentários

Comentários fora de tópico, violentos, incompreensíveis ou insultuosos serão sumariamente apagados.

Arquivos

Categorias