The Ressabiator

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Se não podes pô-los a pensar uma vez, podes pô-los a pensar duas vezes

Zombies Capitalistas do Espaço Sideral

deadspace

Neste momento, os zombies parecem ser o acessório da moda em ficção. Qualquer coisa fica bem com um zombie: há uma versão dos heróis Marvel em zombie; há uma versão dos heróis DC em zombie; há uma versão do Orgulho e Preconceito em zombie; há filmes de zombies, livros de zombies, jogos de zombies.

Há um jogo para Playstation 3 chamado Dead Space, passado numa estação espacial gigante em órbita de um planeta inóspito onde uma doença misteriosa reanima os cadáveres da tripulação morta, criando um ecossistema de criaturas assassinas com funções especializadas: umas matam, outras reanimam, algumas envenenam o ar; uma espécie em particular, quando desmembrada, dá origem a criaturas mais pequenas, braços, pernas e cabeças zombies que perseguem o jogador pelos corredores escuros da nave. Apesar do nome usado ser “Necromorfos”, a coisa é toda muito “Alien Vs. Zombies” – o que confirma o carácter do zombie como adjectivo que se pode pôr à frente de tudo e mais alguma coisa, sempre com bons resultados.

Para quem gosta de jogos, o interesse deste está em arranjar maneiras de acabar com seres que não podem ser mortos. Atirar sobre eles não serve de nada; é preciso desbastar-lhes os membros um a um com serras eléctricas, metralhadoras, lança-chamas ou – se forem pequenos – calcando-os com os pés. Mas, se só cortarmos as pernas a um, ele vem a arrastar-se atrás de nós e morde-nos até à morte, o que poderia até ser cómico se não fosse pela atmosfera macabra do jogo, com coisas a saltarem-nos em cima de todos os cantos escuros, preferindo atacar-nos quando estamos de costas.

Quando se entra na estação espacial, está tudo destruído e o objectivo do jogo é ir pondo as coisas a funcionar – os transportes, a navegação, a atmosfera. Para isso, tem que se ir recolhendo material, armas e créditos de uma ponta à outra da gigantesca nave. Pode-se adquirir mais objectos nos diversos postos de venda espalhados um pouco por todo o lado.

Este sistema de ir comprando as coisas à medida que se vai ganhando créditos é comum em jogos deste género, mas em Dead Space está particularmente bem integrado no ambiente do jogo, o que levanta uma questão curiosa: o personagem consegue ultrapassar todas as passwords que encontra pelo caminho, pondo a funcionar armas, electricidade e atmosfera; no entanto, não lhe passa pela cabeça reprogramar as máquinas de venda de modo a dar-lhe gratuitamente tudo o que precisa.

Sem dúvida que, para ajudar à dinâmica do jogo, é necessário que se vá comprando as coisas aos poucos, mas é tentador especular que tipo de sociedade sustentaria um herói cuja ética lhe permite infiltrar-se em todo o tipo de sistemas para salvar a vida, excepto nos das máquinas de venda. Provavelmente terá sido educado numa sociedade hiperneoliberal, onde a iniciativa empresarial domina toda a moral social, onde todas as acções e todas as decisões têm que ser sustentadas por formas de auto-financiamento. É evidente que, numa sociedade como a nossa, onde escolas, hospitais e serviços são cada vez mais sujeitos a este género de esquema para salvarem a vida, mal chega a ser irónica a ideia de uma série de gente a ser dizimada a centímetros de distância de tudo o que precisa para ser salva, mas a que não pode aceder por causa de uma espécie qualquer de dogma económico.

Filed under: Economia, Não é bem design, mas...

5 Responses

  1. Hahaha, este final fez-me rir!

  2. […] [1] Já tinha escrito sobre zombies, consolas e capitalismo aqui. […]

  3. […] sim: este texto foi escrito para fazer par com este). Share this:FacebookTwitterGostar disto:GostoBe the first to like this […]

  4. […] dos Zombies, dos Vampiros e dos Hipsters, nesta série de textos dedicados a economias radicalmente diferentes […]

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