A melhor demonstração da ideia de Morte do Autor está na capa das suas edições mais recentes aqui em Portugal. Têm uma fotografia do autor, o próprio Roland Barthes. Numa análise superficial, dir-se-á uma contradição. O autor a aparecer na capa da sua morte. Não só o sujeito que escreveu, mas realmente o Autor, a figura tutelar, que aparece como uma fonte física de autoridade, que, mesmo gordo, careca e o resto, mesmo que ele próprio o proíba, como Salinger e Pynchon, tem que aparecer, tem que se ver a cara dele para confiar no livro.
Mas não, não é uma contradição, só uma confirmação. Barthes está morto, foi atropelado pela carrinha do homem do leite. E, mesmo quando estava vivo, já se podia fazer tudo o que se quisesse com o trabalho dele. O único obstáculo era ele próprio.
As primeiras edições dele em Portugal eram perfeitamente Barthianas. Nas capas tinham padrões quase abstractos. Uma delas tinha a demonstração diagramática de como funciona o formato A4. A geometria recursiva lembrava indirectamente arte islâmica porque o objectivo era próximo: não representar a figura do profeta. Na contracapa não vinha a foto do autor.
Acabo sempre por gravitar para estas edições brancas, as mas antigas de Barthes, não pela fidelidade aos princípios do Autor, mas porque percebi que, apesar de toda a perfeição canónica do design das mais recentes, consigo lê-las bem melhor.
Mas o que sei é que estas novas edições, com a foto do homem na capa, demonstram bem que o Autor morreu, porque até com Barthes se pode fazer o oposto do que ele quereria.
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