The Ressabiator

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Se não podes pô-los a pensar uma vez, podes pô-los a pensar duas vezes

Tom Sawyer

A última Personal View não foi das melhores. Ian Anderson, dos Designers Republic estava rouco e, de quando em quando, a sua tosse mandava um zumbido de feedback pelo microfone. Para piorar, não quis falar sobre o seu trabalho porque não queria “estragar a magia”, analisando-o demais – embora mais tarde tenha dito que a análise e a capacidade para argumentar o próprio trabalho perante um cliente era uma das qualidades que qualquer designer deveria ter.

Respondeu a uma lista de perguntas recolhidas por escrito entre a plateia, enquanto o seu trabalho era projectado num loop rápido – o que acabava por ser apenas uma distracção, tendo em conta que só por acidente correspondia àquilo que era dito. No final, acabou por ser mais uma daquelas ocasiões em que a participação do público foi invocada para disfarçar uma falta de preparação.

Nas escolas de artes, nesta altura do ano, a “participação” também está na moda – o que geralmente se traduz em obrigar quem vai a passar a aguentar ruídos altíssimos enquanto tenta encontrar o caminho para a sala de aula pelo meio de um labirinto ou através de uma performance (já é uma sorte não ficar molhado ou com lesões auditivas permanentes).

O que chateia mais nesta “participação” toda é a condescendência para com o público, que é tratado como uma coisa amorfa, acrítica e passiva, que não tem mais nada para fazer senão “participar” em tudo o que lhe atiram pela frente. No teatro, por exemplo, a “participação” do público também se tornou o cliché por defeito – em qualquer peça mal amanhada se põe o pobre do público a “participar”. A queixa é, como seria de esperar, que o público já não se interessa.

Mas o público participa naquilo que lhe interessa, naquilo que acha que vale a pena e, na maioria dos casos, boa parte dos eventos “participativos” são apenas sinónimo de má preparação disfarçada de democracia – não interessam.

Nas Aventuras de Tom Sawyer, quando Tom é obrigado pela tia a caiar uma cerca, ele torna o castigo de tal maneira interessante, que os amigos lhe pagam para o fazer por ele. Tom tinha “descoberto, sem o saber, uma grande lei da acção humana – que para fazer um homem ou um rapaz cobiçar qualquer coisa, só é preciso tornar a coisa difícil de obter. Se ele fosse um velho e sábio filósofo, teria compreendido que o Trabalho consiste em algo que se é obrigado a fazer, enquanto a Diversão consiste em algo que não se é obrigado a fazer.” Quem me dera que a maioria das pessoas que já abusaram da paciência de terceiros às custas da palavra “participação” também conhecessem esta grande lei.

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