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Se não podes pô-los a pensar uma vez, podes pô-los a pensar duas vezes

A Eterna Juventude

No penúltimo texto falei sobre os problemas laborais dos jovens portugueses ou, mais exactamente, sobre a infantilização crescente que lhes é imposta, condenando-os a, já depois dos trinta, viverem em casa dos pais, saltando de estágio em estágio ou de bolsa em bolsa. Mesmo a qualificação crescente a que são sujeitos, condenados a um sem fim de cursos, formações, pós-graduações, mestrados e doutoramentos, acaba por ser um peso e a marca de uma injustiça – estuda-se porque não se pode trabalhar.

Não é um problema que se resuma a Portugal. Segundo um artigo do New York Times, acontece em todo o Sul da Europa. Os casos apresentados parecem ter sido seleccionados pela sua ironia: uma advogada estagiária italiana que trabalha de graça para a segurança social e já deu milhares de euros a ganhar aos pensionistas do seu país, mas cujos esforços nem sequer contam para a sua própria reforma é talvez o melhor.

Tal como o artigo refere, a incapacidade de empregar legitimamente os jovens vai sem dúvida ter consequências sobre o próprio estado social: se alguém só tem emprego depois dos trinta só vai começar a pagar segurança social nessa altura e entretanto quem paga as pensões actuais? É só uma questão de tempo até os cofres secarem.

É difícil imaginar uma solução fácil para tudo isto, porque a própria sociedade, enquanto vai lamentando o problema, vai arranjando também racionalizações que justificam a situação, eternizando-a. Há cada vez menos disponibilidade para depositar responsabilidades nos mais novos.

Uma solução possível, que pode parecer pouco eficaz, é na verdade bastante simples: as pessoas mais novas devem votar sempre que puderem. Já várias vezes se comentou que se vota mais entre as camadas mais velhas do que as mais novas. Se os jovens começarem a votar mais cedo e em maior número pode ser que comecem a ser mais ouvidos – boa parte dos políticos só pensa em vencer eleições.

Mas boa parte dos jovens portugueses passam mais de uma década no limbo, ocupados em coisas que não são nem estágios, nem empregos, nem aprendizagem nem ensino, nem desemprego, nem emigração. É um estado de precariedade e de exclusão que vai minando a capacidade para acreditar na sociedade em que se vive: fazer trabalho produtivo durante anos sem receber qualquer tipo de dinheiro ou legitimidade é uma excelente maneira de formar cínicos ou conformistas.

Filed under: Crítica, Cultura, Design, Economia

7 Responses

  1. Ltic diz:

    nem mais. é isto o elixir da juventude nos tempos modernos.

  2. realvst diz:

    completamente de acordo!

  3. Jorge Castro diz:

    O meu chapéu e aplauso pelo desassombro – voz rara neste deserto de medos.

    Cheguei aqui exactamente por sugestão do meu filho, um dos tais que procura, afanosamente, uma vida a que se agarrar, através de competências já bem testadas, mas que vai deparando com muros atrás de muros de dificuldades… e de iniquidades.

    Mas se eu soube transmitir um testemunho foi esse: o voto. Talves uma miserável manifestação de cidadania. Mas, ainda assim, um direito que nos é inalienável.

    Na verdade, talvez muitos jovens abstencionistas ainda não tenham pensado bem no peso que o seu (ainda que miserável) voto de protesto – seja ele qual for – pode vir a pesar num resultado eleitoral… E aí, sim, talvez a «classe política» os começasse a olhar com outros olhos.

    Quanto ao mais, confesso a minha apreensão num futuro nem sequer muito longínquo, onde a Segurança Social pura e simplesmente não exista, pela cristalina razão de que ninguém a sustenta.

    E um jovem não é jovem toda a vida…

  4. Pedro Maia diz:

    Tenho acompanhado as tuas opiniões que partilho. Parabéns.
    Relativamente à participação nas eleições não sei se existe um estudo por escalão etário, mas penso que os quase 600.000 votantes do Fernando Nobre são, na sua grande maioria jovens entre os 22 e os 35 anos que se preocupam, querem participar e desenvolvem opinião crítica acerca da nossa sociedade. Há uma fatia importante desta geração que está formatada, conformada por falta de estímulos, de referências. Penso que os outros, sei lá, 400.000 têm (temos) de agir mais, criando movimentos de comunidade que comecem a agitar as mentalidades e a “recrutar” esses outros para uma causa que é de todos. Estes movimentos de comunidade não devem ser políticos nem falar de política. Têm de ser movimentos culturais, artísticos, desportivos, científicos. O objectivo será envolver, juntar para construir uma comunidade mais forte, com mais opinião, para que depois sim, possamos tomar as rédeas do nosso futuro colectivo. Bom trabalho!

  5. […] nem vou a concertos; só soube da canção através dos links que muita gente fez, associando um dos meus textos a essa música, mas tive a consciência clara que, naquele dia no Coliseu, tinha nascido uma  nova […]

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