The Ressabiator

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Se não podes pô-los a pensar uma vez, podes pô-los a pensar duas vezes

20 anos de Ressabiator: tendências


Não acredito que o design seja ou deva ser uma disciplina uniforme. Num dado momento ou local, há sempre interpretações e práticas muito distintas do que deve ser o design. Já envelheci o suficiente para ver como tudo muda. E muito.

Os gostos mudam, as tecnologias mudam, as identidades mudam, o design muda. Há tendências não apenas nas formas e nas cores, mas também no pensamento e na ética. Surpreendentemente para mim, muitos designers veem a própria ideia de tendência como má – criticam o que chamam “trends”.

Tenho consciência que ao começar a escrever num blogue fiz parte de uma tendência. Há vinte anos, tecnologia e cultura criaram a oportunidade para pessoas como eu desenvolverem um discurso público.

Também sei que tenho o meu gosto e as minhas filiações. Durante os últimos vinte anos, interessei-me acima de tudo por edição no contexto do design. Comecei por influência de revistas como a McSweeney’s ou a Dot Dot Dot. O blogue esteve para ser uma publicação deste género.

Este interesse teve ecos nas minhas aulas. Comecei por ensinar paginação, mas depressa percebi que não chegava. Foi-me atribuída uma cadeira (já nem sei em que ano) onde se esperava que os alunos fizessem investigação em design. Porque não fazer também investigação através do design, usando para isso a edição?

Por outro lado, também tentei desenvolver uma alternativa ao mau hábito de formar alunos para serem estagiários. Era esse o “produto” final típico dos cursos de design clássicos. Assumia-se que o aluno saía da escola e só seria realmente um designer depois de passar por um estágio qualquer.

O discurso neoliberal do pós-Bolonha parecia-me contraditório no sentido de, ao mesmo tempo, promover o empreendedorismo dos alunos, enquanto os condenava ao estágio. Parecia-me que a melhor maneira de ensinar autonomia e agência aos alunos não era através da transposição de modelos de estúdio para a escola. Não queria fazer de mim um um patrão e do aluno um estagiário, mas de ensinar os alunos a tomarem decisões através da tomada de decisões. Eu deveria ajudá-los a tomarem decisões informadas.

Perguntei-me também quais são as decisões específicas que um designer deve saber tomar para ser autónomo. Demasiadas vezes assume-se que essas decisões dizem respeito a saber fazer orçamentos, cuidar de assuntos fiscais, ou perceber de gestão. Mas isso são competências relativamente genéricas. O que é uma decisão de design?

Dentro do campo da edição, percebi que tinha de avançar acima do nível da paginação e pôr os estudantes a tomarem decisões sobre a estrutura da publicação e a articulação dos seus conteúdos, fossem eles visuais ou textuais.

Não é um trabalho especulativo. Muitos dos designers mais considerados em Portugal das últimas duas décadas fazem este tipo de trabalho e tomam este tipo de decisões — Márcia Novai, Rui Silva, Inês Melo, Maria João Macedo, Daiana Luca ou Isabel Duarte (todos passaram pelas minhas aulas). Ao nivel internacional, a edição foi uma área florescente no design nessas décadas. O design português foi várias vezes premiado nesse âmbito.

Nem sempre foi um esforço compreendido. Por várias vezes, tratou-se este trabalho como sendo mero design editorial (ou seja, paginação e tipografia). Não entendo o design editorial na sua aceção clássica e limitada.

Filed under: Crítica

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